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Floresta da Tijuca - Rio de Janeiro - Uma impressionante história de reflorestamento

Com a chegada da Corte Portuguesa no Rio de Janeiro, em 1808, e posterior independência do Brasil, em 1822, houve um rápido aumento da população da cidade, que passou de 50 mil habitantes, em 1808, para 113 mil em 1820, chegando a mais de 250 mil habitantes em meados do século 19.  

O aumento da população gerou não somente a necessidade de expansão da cidade sobre a Mata Atlântica, mas aumentou também a pressão sobre recursos naturais, como madeira para construções, lenha, carvão e água.

A formação de fazendas de café, então o principal produto de exportação do Brasil, bem com outras culturas de subsistência como milho, mandioca, cana-de-açúcar etc., exigia novas áreas, o que ocasionou o desmatamento progressivo de extensas áreas em torno do Maciço da Tijuca.

O desmatamento crescente das encostas levou à ocorrência de diversos problemas ambientais, sendo o mais destacado, uma sequência de secas (1824, 1829, 1830, 1833 e 1843) e redução do volume dos mananciais de água.

“A destruição fluiu, de maneira geral, da planície litorânea e interiorana, em direção as encostas, geralmente através das margens dos principais rios como o Carioca, Caveira, Tijuca, das Almas, Archer, Trapicheiro, Solidão e Macacos. Esse e outros mais, formavam um total de 43 rios e córregos, originários do maciço da Tijuca, criavam uma rede hídrica que alimentava lagos e represas, abastecendo diversos bairros da cidade do Rio de Janeiro, através de chafarizes, bicas e aquedutos”[1]

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Enseada de Botafogo

Johan Moritz Rugendas - 1820 

Johan Moritz Rugendas - Derrubada da flo

Derrubada de uma floresta 

Johan Moritz Rugendas - 1835 

Em 1860 o assunto da falta de água ganhou especial atenção e, após o debate entre os cientistas do Imperial Instituto, concluiu-se que a causa do problema era o desmatamento das florestas. Assim, em 1861, D. Pedro II declara o Maciço da Tijuca como Floresta Protetora e tem início um processo de desapropriação de chácaras e fazendas a fim de permitir o reflorestamento e a regeneração natural da floresta.  Desta forma, a Floresta da Tijuca, instituída e protegida por um decreto, passou a ser talvez a área de proteção ambiental mais antiga do mundo, anterior ao Parque Yellowstone, o Primeiro Parque Nacional, que foi criado em 1872 nos Estados Unidos. 

O Decreto Nº 577, datado de 11 de dezembro de 1861, que instruía “o plantio e conservação das florestas da Tijuca e das Paineiras” determinava que fossem “plantados arvoredos no país pelo sistema de mudas e em linha reta”, começando de ambas as margens das nascentes dos rios. O art. 2º do Decreto № 577 indicava que o plantio deveria se dar, preferencialmente, nos locais claros das florestas da Tijuca e Paineiras e que, além do plantio, os funcionários (administrador, feitores, serventes e escravos assalariados) deveriam atuar também na sua proteção, impedindo a caça e a extração de produtos florestais [2].

Mesmo com a reação negativa de alguns proprietários de terras que tiveram suas propriedades desapropriadas a causa do reflorestamento contatava também com alguns simpatizantes, como o presidente do Imperial Instituto e Ministro, Luiz Pedreira do Couto Ferraz (Visconde de Bom Retiro), que conduziu o processo de desapropriação das propriedades e fazendas na área de Floresta da Tijuca. Luiz Pedreira Ferraz era seguidor da corrente ambientalista europeia, que já naquela época apontava as consequências negativas da Revolução Industrial sobre a qualidade de vida nas cidades e defendia a ideia de espalhar parques pelas capitais do mundo para assim, tornar a vida urbana saudável.

Vale também destacar que entre o final do século XVIII e início do XIX, já existiam no Brasil diversos críticos sobre o modelo de ocupação humana existente e sobre a destruição indiscriminada dos recursos naturais brasileiros.

A missão de reflorestamento da floresta da Tijuca foi atribuída ao Major Manuel Gomes Archer. Nascido em 21 de outubro de 1821, Archer era engenheiro, membro da Guarda Nacional e um entusiasta da flora brasileira.  Por treze anos, entre 1861 a 1874, Archer ficou à frente do projeto de reflorestamento desta área.  

Outra figura importante neste projeto, menos conhecida, nomeado como administrador da floresta das Paineiras, foi Tomás Nogueira da Gama.

O trabalho de reflorestamento na Floresta da Tijuca iniciou-se com uma equipe que incluía feitor, guardas das matas, operários, pessoal da conservação e reparo dos caminhos, aos quais se juntaram posteriormente 6 escravos assalariados, o que aumentou a capacidade de plantio. A equipe envolvida no reflorestamento variava entre 4 a 20 trabalhadores. [3]

Inicialmente as mudas de maior porte, cerca de 1 metro, foram coletadas nas florestas remanescentes, como Paineiras e matas virgens de Guaratiba, e transportadas para os locais definitivos onde eram plantadas, diretamente. Esse processo apresentou um alto índice de mortalidade.   

Posteriormente, passaram a coletar mudas de menor tamanho, com pouco mais de um palmo, que eram acondicionadas em cestos de palha e levadas a viveiros até que atingissem um porte maior, quando então eram plantadas nos locais definitivos. Este procedimento resultou em um aumento da taxa de sobrevivência.

A partir de 1869, tiveram início as coletas de sementes nas matas de Jacarepaguá e de Guaratiba o que proporcionou melhores resultados nos plantios. Para apoiar o trabalho de produção de mudas, Archer criou um Horto Florestal.

Johan Moritz Rugendas-Cascata da Florest

Cascata da Tijuca 

Johan Moritz Rugendas - 1835 

Ao contrário do que previsto no Decreto, Archer plantou as mudas de forma aleatória e não em linhas. Entre as espécies plantadas incluíam-se principalmente árvores da Mata Atlântica tais como, ipê, pau-brasil, peroba, angelim-rosa, sapucaia, canela, pau-ferro, jacarandá, vinhático, sibipiruna, além de frutíferas com jabuticaba, cambucá, jaca (exótica), etc. 

Em seu último relatório, foram contabilizadas 61.852 árvores plantadas, embora os registros sejam imprecisos e aparentemente o número tenha sido maior do que esse. Major Archer deixa o cargo de administrador da floresta da Tijuca, para dedicar-se a um projeto similar em Petrópolis.

O substituto de Archer, foi o Barão d'Escragnolle, que foi administrador da floresta entre o período de 1875 a 1888. Gastão Luís Henrique de Robert d'Escragnolle nasceu no Rio de Janeiro em 16 de abril de 1821 e morreu em 16 de junho de 1886. Foi um nobre, militar e político, ajudante de ordens de Duque de Caxias, deixando a carreira militar para dedicar-se à administração pública.

 

O Barão d'Escragnolle levou adiante os esforços de reflorestamento do seu sucessor, aperfeiçoando as técnicas de plantio de mudas e de sua aclimatação para aumentar sua taxa de sobrevivência. Ele começou a sistematizar o plantio de mudas de árvores utilizando técnicas metódicas aprendidas na agricultura convencional. As mudas eram plantadas em cestos de palhas, que ficavam em viveiros e, após o seu crescimento e aclimatação, eram transplantadas em seus locais definitivos, sendo colocadas nas covas com os cestos que depois se desfaziam com a umidade. Desta forma eles garantiam um processo de adaptação suave das mudas ao terreno. Neste período ele não somente diversificou o plantio de espécies da Mata Atlântica, como passou a introduzir espécies exóticas, como o eucalipto.

 

D'Escragnolle dispunha de uma equipe maior, dividida em 20 homens dedicados ao plantio da floresta e 15 homens responsáveis pela conservação, que tinham a responsabilidade de abertura e manutenção de caminhos, bem como as obras de paisagismo. Sob a orientação do paisagista francês, Auguste François Glaziou, engenheiro civil e botânico, então diretor de Parques e Jardins, a floresta foi tomando a forma de um parque, com áreas de lazer, lagos, recantos e fontes para atração e uso da população.

 

Ao longo da administração do Barão d'Escragnolle, foram plantadas 21.489 mudas. Ao final dos dois períodos de administração, somaram-se aproximadamente 83.500 mudas, embora alguns autores sustentem que o plantio chegou a 95.000 mil mudas.

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Com o fim do Império, na transição para a República, a Floresta da Tijuca caiu em esquecimento e abandono por quase 50 anos, tendo passado a ser administrada por diversos Ministérios. Neste período destacam-se as obras dos Mirantes da Vista Chinesa e Mesa do Imperador, sendo a mais importante, entretanto, a da construção do Cristo Redentor, inaugurada em 1931, que passou a ser o cartão postal da cidade.

 

A Floresta da Tijuca tornou a ser revitalizada entre 1943 e 1947, sob a gestão de Raymundo Ottoni de Castro Maya, que trabalhou voluntariamente à frente de uma equipe de 60 homens, cujas iniciativas incluíram a abertura dos Restaurantes dos Esquilos, Floresta e Cascatinha, bem como a consolidação das vias internas, pontes, muros de contenção e recantos, incluindo projetos paisagísticos de Roberto Burle Marx (remodelação e paisagismo do Açude da Solidão) e do arquiteto Wladimir Alves de Souza (autor do projeto dos portões).

 

O trabalho iniciou-se com a demarcação dos limites da floresta. Sob sua administração foram realizadas mais de 22 obras de reformas e benfeitorias, bem como melhoramento das estradas de acesso e a abertura de picadas para os passeios de pedestres. Seu objetivo era o de transformar a Floresta da Tijuca em um roteiro de lazer para a população, criando diversas atrações que permitisse maior volume de visitantes.

Enfim, em 1961, o Maciço da Tijuca, incluindo as áreas de Paineiras, Corcovado, Tijuca, Gávea Pequena, Trapicheiro, Andaraí, Três Rios e Covanca, foi transformado em Parque Nacional, recebendo o nome de Parque Nacional do Rio de Janeiro, com 33 km².

 

Posteriormente, em 8 de fevereiro de 1967, seu nome foi definitivamente alterado para Parque Nacional da Tijuca. Em 04 de julho de 2004, um Decreto Federal, amplia a área do parque para 39,51 km², com a incorporação do Parque Lage, Serra dos Pretos Forros e Morro da Covanca.

Hoje o Parque Nacional da Floresta da Tijuca é a maior e mais antiga floresta urbana do mundo, sendo essencial para a conservação da biodiversidade, o equilíbrio ecológico e urbano, bem como o lazer no Rio de Janeiro.

 

O exemplo da Floresta da Tijuca mostra como mentes visionárias de alguns poucos homens, à frente de seu tempo, devotados e dedicados ao bem coletivo, puderam realizar um trabalho monumental, deixando para futuras gerações um valioso legado. Este exemplo inspirador, mostra como um grupo que poucas pessoas conscientes e com propósitos bem definidos, podem realizar um trabalho com grandes efeitos positivos para toda a sociedade. 

 

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Corcovado e Floresta da Tijuca

Yolanda Schanrk

Pedra da Gávea

Yolanda Schanrk

Mapa_Parque Nacional da Floresta de Tiju

Mapa do Parque Nacional da Floresta da Tijuca

ICMBio - Fonte Wikipedia 

FONTES

[1] Parque Nacional da Tijuca — 140 Anos da reconstrução de uma floresta. Marcos Sá Corrêa, Gustavo Martinelli, Pedro da Cunha e Menezes, Ricardo Azoury. Editora Ouro Sobre Azul, 2001

[2] Plano de Manejo do Parque Nacional da Floresta da Tijuca

http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/docs-planos-de-manejo/parna_tijuca_pm.pdf

[3] Um parque sob encantos e desencantos: a Floresta da Tijuca, do reflorestamento a patrimônio paisagístico mundial- Elisama Beliani, Nilson Alves de Moraes, Luiz C. Borges

https://www.15snhct.sbhc.org.br/resources/anais/12/1474041921_ARQUIVO_TEXTOcompletoSBHC2016-VERS3.pdf

[4] Enciclopédia Itau Cultural - http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa707/ruGilson

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